Ideólogo racista, Ministro de Lula e Estatuto sem igualdade

Em recente nota, ministro da SEPPIR faz nova demagogia com o Estatuto da Igualdade Racial e a “sociologia” de Demétrio Magnoli casa perfeitamente com essa demagogia e com os reacionários do Democratas.

A sociologia de Demétrio Magnoli é o fundamento ideológico da ação do Democratas, filhote da ditadura e da extrema direita. O sociólogo (para não chamar de racista) defende que não há racismo na sociedade e, por isso, não é necessária nenhuma ação afirmativa. Confirmando isso, o Ministro Edson Santos da SEPPIR – Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – recentemente defendeu pela milésima vez o Estatuto da Igualdade Racial desprovido de igualdade, e mais, disse que é uma solução para o fim do racismo do Brasil. O absurdo de Santos parece apenas uma defesa barata do governo perto do racismo descarado do sociólogo.

Ministro Edson: “Estatuto da Igualdade Racial para acabar com o racismo”.

Em artigo publicado no sítio virtual O Globo, o ministro Edson Santos insistiu que o Estatuto da Igualdade Racial é a “mais importante ferramenta” para alcançar o fim da desigualdade racial. Que o estatuto “surge para dar consequência e aplicabilidade ao texto da Constituição de 1988, que, desde o seu preâmbulo e em diversos de seus artigos, confere ao Estado a responsabilidade pela promoção da igualdade e o combate aos preconceitos”. A referência diz respeito ao artigo 3º, que diz que é objetivo fundamental do Estado “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Citando Joaquim Nabuco (1849-1910), que se opôs ao regime escravista brasileiro e “profetizou” que o Brasil levaria um século para livrar-se da desigualdade entre os ex-escravos e os demais cidadãos, Santos, ao mesmo tempo em que considera otimista a declaração de Nabuco, contraditoriamente atribui ao Estatuto o papel de importante ferramenta contra a desigualdade racial.

Primeiro vamos nos ater a nova manifestação do ministro sobre a importância do Estatuto da Igualdade Racial. Não há qualquer medida nesse Estatuto que venha minimamente reduzir a desigualdade racial no Brasil. Como já analisamos aqui, essa proposta possui apoio da base governista, do próprio governo e da “oposição”, DEM, PSDB etc. Seu texto não prevê nenhuma ação objetiva com o fim de reduzir a desigualdade racial, e, como tantos outros projetos, tornar-se-á, como negociou a extrema direita: letra morta.

O ministro insiste em defendê-lo apenas para mostrar a Lula que ele está fazendo o trabalho direitinho, esquartejando a proposta original para se tornar apenas uma peça ilustrativa no gabinete do governo Lula, que por sua vez pretende sancionar essa lei no dia da Consciência Negra, 20 de novembro, e assim fazer mais demagogia como se fosse um governo à favor do povo negro. Mesmo que as constantes pesquisas sobre renda, educação, moradia, ainda mostram o negro completamente oprimido pelo Estado burguês como há décadas atrás.

Igualdade perante a lei, a biologia diz que somos iguais, então não há racismo? Magnoli e a teoria racista

Outro fator importante, citado pelo próprio ministro da SEPPIR, é essa igualdade formal fornecida pelo texto constitucional, existente também em outros diplomas legais. Esse argumento, de que “somos iguais perante a lei” é a pedra fundamental dos ideólogos racistas quando recusam a implantação do sistema de cotas nas universidades brasileiras. Dentre eles, tem-se destacado Demétrio Magnoli, com o velho sofisma de que se não existem raças, do ponto de vista biológico, mas que usa isso para afirmar que por isso não existe racismo. Outro abuso ideológico de uma sentença: se não há diferenças no plano jurídico (como afirma a constituição), não o há na sociedade. Fica claro que o propósito de Magnoli ao afirmar que as raças não existem biologicamente não é afirmar a igualdade, mas negar que existe opressão do negro pelo branco na realidade, o que impediria qualquer tentativa de ação afirmativa para a população negra. E, apesar da pouca aplicabilidade, a Constituição diz em seu artigo 4º que o Estado Brasileiro repudia o racismo, determinando, no inciso XLII do artigo 5º, que sua prática se constitui em crime inafiançável e imprescritível. Ora, se é punível o racismo pela própria Constituição, em que se baseia a teoria de Demétrio? É apenas racismo disfarçado. Ele vai além, se não há raça, não há conflito racial, e ação afirmativa seria uma atitude que levaria a um conflito racial de fato.

O surpreendente desta campanha levada a cabo por Magnoli (e o direitista grupo Millenium), Democratas etc. é que seja tão claramente racista, diante de toda a demagogia e hipocrisia em torno da questão do negro no Brasil nos últimos tempos de farta demagogia “democrática". O fato indica um forte movimento da direita no sentido da polarização política. Mas justamente por ser uma operação delicada é que necessita dos ideólogos, ou seja, pessoas que revestem essa ideologia racista e reacionária de uma camada de confeito “democrático” e consiga torná-la palatável para que uma parte da classe média conservadora possa se agrupar detrás dela.

Democracia burguesa é democracia racista

Vários são os argumentos capciosos com que se pretende enganar a população negra. Um dos principais é a igualdade jurídica, ou seja, igualdade formal dos cidadãos. Fundamentalmente o que nos interessa aqui é o caráter racista dessa tese, e não debatê-la abstratamente, como se estivéssemos defendendo uma tese de doutorado. No geral os liberais como Magnoli são como teólogos da democracia, como se essa tivesse surgido no mundo moderno para substituir a tábua dos dez mandamentos, vinda dos céus. A democracia, na realidade, por força do conservadorismo da burguesia é colocada acima da realidade, como um valor supremo e incontestável, sem nenhuma relação com o mundo real. Somos “iguais perante a lei, o Estado” e ponto final. Uma norma para além do mundo, intocável e insuperável. Apenas por um acaso negros são a maioria da população carcerária, de moradores de rua, de desempregados.

Em seu texto, Edson Santos até caracteriza bem o tipo de posicionamento do sociólogo Magnoli: “São muitas as razões que impossibilitaram a ascensão social dos negros (...) as teorias racistas de “embranquecimento” da população; o mito da democracia racial brasileira, que conduziu a uma quase total invisibilidade da questão negra; e toda uma herança discriminatória forjada em mais de 350 anos de escravidão.” Porém a saída desta situação proposta pelo ministro chega a ser cínica: “hoje sabemos que a democracia racial é, em verdade, um objetivo a ser alcançado, pois somos uma nação desigual, com os negros na base e os brancos ocupando o ápice da pirâmide econômica. Felizmente, no atual estágio de suas instituições democráticas, nossa sociedade está suficientemente madura para discutir a transformação desta realidade sem incitar o ódio racial ou ocasionar maiores traumas. Basta não perder de vista que o objetivo não é dividir, mas integrar. Fazer com que negros, brancos, indígenas, ciganos e outros segmentos tenham não apenas a igualdade formal dos direitos, mas a igualdade real das oportunidades. O Estatuto da Igualdade Racial, projeto de lei que há mais de uma década tramita no Congresso Nacional, é a mais importante ferramenta para alcançar este objetivo.” A integração proposta por Edson Santos curiosamente casa com um dos argumentos do sociólogo Demétrio Magnoli, quando este chega ao absurdo de acusar o negro de racista, por defender uma separação em relação ao branco, e assim se coloca como um defensor da famosa miscigenação brasileira.

A defesa feita por Magnoli da miscigenação para encobrir a opressão do negro na sociedade é uma política claramente racista, o que pode ser comprovado pelo fato de que era a política do Integralismo. Esta variante brasileira de fascismo pregava justamente a “fusão das raças”, ou seja, a “miscigenação”, que significava no final das contas a assimilação do índio e do negro pelo branco, que constituiria assim o “homem integral”, a “raça superior”, adaptada aos trópicos. Nestes terrenos, defendemos que é o negro, o oprimido, quem deve decidir a política a ser adotada e não o branco opressor.

O ministro do governo finaliza sua nota nos dando uma aula prática e objetiva sobre o objetivo da ideologia racista de Magnoli. O arremedo de Estatuto da Igualdade Racial, sem recursos, sem obrigatoriedade, sem direitos, foi aprovado “graças a um acordo costurado entre todos os partidos presentes”, o Democratas, PSDB, PMDB, ou seja, latifundiários, racistas e burgueses. E continua: “considerando a solidez dos acordos firmados entre o governo, os partidos e a sociedade civil, estou convicto de que, muito em breve, teremos condições de aproximar o Brasil do ideal de Nabuco”. Pode até ser, pois Nabuco era um monarquista, branco, e defendia a reforma social sem violência.

A luta dos negros brasileiros é uma luta social que não pode ter outra forma que não seja a luta política pela destruição do Estado burguês que garante e perpetua a opressão e a desigualdade. Não em oposição, mas complementando, os direitos democráticos e seus avanços também devem ser agarrados com unhas e dentes, principalmente perante a ameaça da extrema direita brasileira.



Matéria publicada no ''Coletivo João Candido''

http://www.pco.org.br/conoticias/ler_materia.php?mat=17810

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