20 de julho aniversário de nascimento de Frantz Fanon


Frantz Fanon (Fort-de-France, Martinica, 20 de julho de 1925 – Washington DC, 6 de dezembro de 1961) foi um psiquiatra, escritor e ensaísta antilhano de ascendência Africana. Ele foi, talvez, o maior pensador do século XX relacionado aos temas da descolonização e a psicopatologia da colonização. Suas obras foram inspiradas nos movimentos de libertação anti-coloniais por mais de quatro décadas.Fanon esteve na Argélia, onde trabalhou como médico psiquiatra no hospital do exército francês e neste hospital testemunhou as atrocidades da guerra de libertação da então colônia francesa, comandada principalmente pelo partido socialista argelino da Frente de Libertação Nacional, da qual fez parte.

Cultura da resistência:

Frantz Fanon, uma voz dos oprimidos. A divisão dos homens entre opressores e oprimidos, a desumanização indígena e o condicionamento do negro pelo branco. Contribuições fundamentais na primeira metade do século passado, as questões debatidas pelo psiquiatra e intelectual negro continuam atuais. Foi como um estrondo no céu do pós-guerra. Em 1952, aparecia Pele negra, máscaras brancas, uma ''interpretação psicanalítica do problema negro''. A introdução proclamava: ''É preciso libertar o homem de cor de si mesmo. Lentamente, porque há dois campos: o branco e o negro''.Seu autor, Frantz Fanon (1925-1961), foi ao mesmo tempo psiquiatra, ensaísta e militante político ao lado da Frente de Libertação Nacional da Argélia (FLN), com a qual compartilhava a causa independentista. Martinicano, faz parte do grupo de intelectuais negros cuja importância a França tem dificuldade em reconhecer, embora tratem de uma história comum a todos. anticolonialista radical, de escrita altamente literária e retórica, contribuiu para aclarar não só a história, mas também reflexões e debates contemporâneos. Preferem, no entanto, esquecê-lo sob o rótulo de ''profeta fracassado''. A temática dos ''dois campos'' evocada por Fanon não é exclusivamente uma oposição entre essas duas cores de pele; inscrevem-se na antinomia ''opressores'' e ''oprimidos''. Em sua visão, ''uma sociedade é racista ou não é'' e ''o racismo colonial não difere de outros racismos''. Quando busca explicar uma ideia-força e mostrar o escândalo que representa, sua prosa poética e retórica se revela. além disso, para ele, a libertação dos indígenas passa pela recusa do mundo da interdição, pela afirmação do “eu” negado pelo colonizador, que os vê como uma massa disforme e serviçal: “o indígena é um ser aprisionado, o apartheid é apenas uma modalidade da compartimentação do mundo colonial. a primeira coisa que o indígena aprende é a manter-se em seu lugar, a não ultrapassar os limites. É por isso que seus sonhos são musculares, de ação, agressivos – Sonho que salto, nado, corro, escalo. Sonho que estou gargalhando, que atravesso o rio com um pulo, que sou perseguido por carros que nunca me alcançam. Durante a coloni- zação, o colonizado não pára de se libertar entre as nove horas da noite e as seis da manhã''. Em outros tempos, Paul Nizan escrevia: ''Enquanto os homens não forem completos e livres, não caminharem por suas próprias pernas nas terras que lhes pertencem, sonharão à noite''. opressão burguesa em 1933, opressão colonial em 1952.

Um libelo apaixonado:

Pele negra, máscaras brancas nos conduz ao universo atribuído ao negro que foi sistematicamente condicionado pelo branco. São páginas apaixonantes nas quais a herança – apesar das divergências – dos oradores da negritude e do texto ''Orfeu Negro'', de Jean-Paul Sartre, se faz sentir por meio de encadeamentos lexicais metafóricos e analíticos do corpo, do olhar. Fanon examina o corpo, talvez por isso escreveu: ''a primeira versão deste livro foi ditada, andando de um lado para outro como um orador que improvisa; o ritmo do corpo em movimento, o sopro da voz recitando o estilo''. Porém, a realidade supera a metáfora: ''No primeiro olhar branco, ele sentiu o peso de sua melanina''. Séculos de escravidão e colonização determinaram um olhar sobre o outro do qual é difícil para não dizer impossível, se despojar: ''Quando me amam, dizem que é apesar da cor da minha pele. Quando me detestam, se justificam dizendo que não é pela cor da pele. Em uma ou outra situação, sou prisioneiro de um círculo infernal''. O racismo se traduz também na designação do negro, submetido à conotação ancestral de sua cor, que se tornou evidência, quase essência: ''O negro, o obscuro, as sombras, as trevas, a noite, as profundezas abissais, denegrir a reputação de alguém; e do outro lado: a mirada clara da inocência, a pomba branca da paz, a luz ofuscante, paradisíaca''. A linguagem não pode expurgar essas conotações, que aparecem também na religião: ''O pecado é negro como a virtude é branca''. A análise não era nova naquele momento, mas, de uma obra à outra, Fanon foi mais longe. Seu último livro, Os condenados da terra (1961), demonstra que a ''compartimentação'' da sociedade colonial e racista gera, obrigatoriamente, uma linguagem racista: ''Por vezes, o maniqueísmo alcança o limite de sua lógica e desumaniza o colonizado''. Dito de outra forma, como denunciou Jean-Paul Sartre durante a guerra da Argélia, o sistema colonial cria um ''sub-homem''.Fanon prossegue: “Falando claramente, [o maniqueísmo] animaliza. Faz-se alusão aos movimentos arrastados durante o trabalho, ao cheiro que emana das vilas indígenas, às hordas, ao fedor, à reprodução desenfreada, às gesticulações. Demografia galopante, massas histéricas, rostos nos quais não há qualquer traço de humanidade, corpos obesos que não se parecem com nada, preguiça sob o sol, ritmo vegetal, todas essas expressões fazem parte do vocabulário colonial''. E vale mencionar que elas ainda não desapareceram totalmente de nossas latitudes, como lembra a canção Lebruit et e l’odeur [o barulho e o cheiro] (1995), do grupo Zebda.A ''desumanização'' do indígena justifica o tratamento ao qual é submetido: ''Disciplinar, vestir, dominar e pacificar são as expressões mais utilizadas pelos colonialistas em territórios ocupados''. A guerra da Argélia nada mais é que a continuação paradoxal de um sistema que se baseia na ''força'' e no desprezo. Dessa forma, a introdução de L’an V de la révolution algérienne [O ano V da revolução argelina] (1959) ressalta que desde o início da guerra, ''[o colonialismo] francês não renunciou a nenhum radicalismo: nem o do terror, nem o da tortura''.Calcularam mal: ''as repressões, longe de sufocarem as revoltas, estimulam o progresso da consciência nacional'', analisa Fanon. ''Se, de fato, minha vida tem o mesmo valor que a do colono, seu olhar não me fulmina mais, sua voz não mais me petrifica. Sua presença não me perturba mais. Na prática, sou eu quem o incomoda. Não só sua presença não me importuna mais, como já estou lhe preparando tantas emboscadas que logo ele não terá outra opção senão fugir''. Assim, a libertação psíquica induz à perda do medo, ao mergulho no combate pela independência.

A violência da palavra:

Em que condições esse combate vai se desenrolar? Em Os condenados da terra postula que ''a descolonização é sempre um fenômeno violento''. Isso por que violência chama violência e quando o opressor invade a menor parcela que seja de um território, é difícil manter-se aí pacificamente: ''Cada estátua, a de Faidherbe ou Lyautey, de Bugeaud ou do Sargento Blandan, todos esses conquistadores que pousaram sobre o solo colonial não param de significar uma única coisa: ''Estamos aqui pela força das baionetas...'''. É evidente a resposta dos oprimidos, considerada estrondosa quando se trata de outros países sob outros comandos. Fanon justifica a violência? Não em todos os movimentos: ''Condenamos, com o coração aflito, esses irmãos que são jogados à ação com a brutalidade quase psicológica que faz nascer e mantém uma opressão secular''. Não obstante, Fanon nos convida à uma compreensão da gênese da violência e da única alternativa deixada aos oprimidos para sua libertação. Sua descrição da ''compartimentação'' da sociedade colonial, com sua ''linha de partilha'' e sua ''fronteira indicada pelos quartéis e postos de polícia'', nos remete, aliás, ao nosso universo militarizado que, bem longe de ''pacificar'', produz ele mesmo o “radicalismo” que pretende combater.A perspicácia de Fanon vale também para sua análise sobre o futuro de um país descolonizado quando uma ''burguesia nacional (in)autêntica'' sobe ao poder e não fornece ao povo ''capital intelectual e técnico''. Baseando-se no exemplo da América Latina, ele previne sobre o risco de transformação de um país em ''território de prazeres a serviço da burguesia ocidental''. Disseca a propensão dessa burguesia ''cinicamente burguesa'' de romper a unidade nacional jogando com o ''regionalismo''. E conclui: ''Essa luta implacável à qual se entregam as etnias e tribos, essa preocupação agressiva de ocupar os postos livres pela partida do estrangeiro vão, igualmente, gerar competições religiosas. Assistiremos a confrontação entre as duas grandes religiões reveladas: o islamismo e o catolicismo''. Fanon alerta até para o perigo de um partido único, que utiliza o passado para ''adormecer'' o povo, ''mandá-lo lembrar da época colonial e medir o imenso caminho percorrido''. Quantos países africanos nos vêm à cabeça?

Em reação à colonização, segundo ele, não se deve clamar por uma cultura negra como único horizonte. Se houve ''obrigação histórica'' para ''os homens de cultura africana ''racializar'' suas reivindicações, de falar antes em cultura africana que em cultura nacional'', por outro lado isso “vai conduzi-los a um beco sem saída”. Suas crenças foram lançadas desde sua primeira obra numa fórmula magnífica sobre a qual os adeptos do comunitarismo poderiam refletir: ''Não quero cantar meu passado às custas do meu presente e futuro''. Tal afirmação, no entanto, não se fecha a uma reflexão sobre a história do colonialismo, a qual, como ele lembrava em 1952, se apoiou sobre a história da Europa. O colonialismo baseou-se em ''valores'' que precisam ser repensados: ''Se é em nome da inteligência e da filosofia que proclamamos a igualdade dos homens, é também em seu nome que decidimos exterminá-los''. Em 1961, a condenação de Fanon se amplificaria com uma veemência radical: ''Abandonemos essa Europa que não para de falar no homem, ao mesmo tempo que o massacra onde quer que o encontre, em todos os cantos de suas ruas limpas, em todos os cantos do mundo''. Afrontemos de uma maneira salutar essa França que, ao mesmo tempo em que se liberava do nazismo e se reconstruía, massacrava Sétif (maio de 1945) ou Madagascar (março de 1947). Essa França que, no fim da batalha, virava as costas aos seus irmãos de combate senegaleses ou marroquinos que estavam na linha de frente. Escutemos essa voz que há mais de quarenta anos martela sua verdade incisiva, que poderia muito bem ainda ser a nossa:
''Podemos fazer qualquer coisa hoje em dia sob a condição de não imitar a Europa, sob a condição de não sermos obcecados pelo desejo de alcançá-la. A Europa adquiriu tal velocidade, louca e desordenada, que escapa a todos os outros condutores, a toda razão, que segue numa vertigem assustadora em direção a abismos dos quais é melhor se distanciar rapidamente''.

Fanon sabe a qual Europa se refere, ele que soube homenagear os judeus da Argélia, os franceses daqui ou de lá que abraçaram a causa independentista. O gesto é universal: ''Eu, o homem de cor, quero apenas uma coisa: que jamais o instrumento domine o homem. Que cesse para sempre a servidão de homem para homem. Quer dizer, de mim para outro.''

Anarquismo Negro nos EUA


O anarquismo negro se opõe à existência do Estado e da subjugação e dominação das pessoas negras, e favorece uma organização não-hierárquica de sociedade. Os anarquistas negros pretendem abolir a supremacia branca, patriarcado, capitalismo, militarismo, imperialismo e o Estado. Teóricos incluem Ashanti Alston, Lorenzo Kom'boa Ervin, Kuwasi Balagoon, Kai Lumumba Barrow, Greg Jackson, Roger White, Martin Sostre e muitos ex-membros do Partido Pantera Negra.



Ashanti Alston afirmou:


''Cultura negra sempre foi oposição e tem tudo a ver com encontrar formas de resistir criativamente a opressão aqui, no EUA o país mais racista do mundo. Portanto, quando falo do anarquismo negro, não é tão ligada à cor da minha pele, mas quem eu sou como pessoa, como alguém que possa resistir, quem pode ver de maneira diferente quando estou preso, e assim viver de forma diferente''.




Anarquistas negros têm criticado o tradicional movimento anarquista com o argumento de que tem sido tradicionalmente dominada pelos brancos europeus. Anarquistas negros opõem a medidas anti-racistas baseada na concepções da moral universalista da idade do Iluminismo, que é proposto pelo anarquista tradicionais. Anarquistas negros argumentam que não é suficiente para lutar contra o racismo.



Os anarquistas negros são influenciados pelo movimento dos direitos civis e também pelo nacionalismo negro porém, buscam construir o seu próprio movimento que representa a sua própria identidade e é adaptada à sua situação presente. Em contraste com ativismo negro que foi baseado em organizações hierárquicas, como o Partido Pantera Negra. O anarquismo negro favorece desenvolvimento orgânico por meio da comunicação e da cooperação, para trazer uma revolução econômica e cultural.



Omali Yeshitela importante líder Pan-africanista






Dinâmico e poderoso orador, brilhante teórico, presidente do Partido Socialista do Povo Africano, fundador do The Burning Spear jornal que publica continuamente desde os anos 60. Autor do livro: Uma Africa! Uma Nação!.

40 anos de liderança ousada e compromisso inabalável pela auto-determinação da comunidade negra. Nasceu em 1941 na Florida com o nome de Joseph Waller foi um jovem implacável líder da junta de militantes organizados na década de 60 sendo um ativo participante do movimento pelos direitos civis, após desenvolver concepções Pan-africanas muda seu nome para Omali Yeshitela atualmente é um veterano na luta pela liberdade Africana, dando continuidade e experiência para o movimento Pan-africanista no século XXI.

Omali se destaca por sua incrível capacidade de percepção teórica que o faz ser extremamente respeitado nos círculos intelectuais sua importância dentro do Pan-africanismo contemporâneo e tamanho que Omali foi aclamado por diversos líderes do Congo, Ruanda, Costa do Marfim, Africa do Sul, Nigéria Angola,Moçambique,Quênia, Gana entre outros países Africanos um marco em sua trajetória revolucionária foi em 1997 quando organizou a conferência da Internacional Socialista Africana oficializando um compromisso revolucionário internacionalista com outros líderes socialista para formação de um ideário para unificação sócio-política e econômica do continente Africano.
Nos EUA construiu o Partido Socialista do Povo Africano que o próprio definiu como sendo um instrumento para realização da revolução Negra. Desde esse tempo o Partido estabeleceu a casa cultural Uhuru com o objetivo de expandir o conhecimento sobre a história Africana e que possui centros em todos Estados Unidos isso acabou levando a criação do Movimento democrático nacional Uhuru que tem como metas defender os direitos civis da comunidade negra e construir instituições econômicas controladas pela própria comunidade é que promova o desenvolvimento da classe trabalhadora negra.

Omali Yeshitela é com certeza um dos maiores, líderes do movimento Pan-africano atual apesar de suas cabal importância infelizmente a mídia dominada por capitalistas reacionários contrário a qualquer tipo de modificação do sistema dominante boicotam, caluniam e difamam a figura de Omali Yeshitela apresentando este homem apenas com um indivíduo lunático movido por idéias ''racistas'' o cerceamento feito pelos meios de comunicação de massa em relação a Omali serve para explicar o fato que no Brasil pouco se conheça a respeito da história, luta e ideologia desse fantástico líder revolucionário dessa maneira este blog tem o compromisso de difundir a mensagem de Omali Yeshitela para que este seja reconhecido em nosso país que tanto carece de líderes negros combativos.

A valor do Garveyismo


Garveyismo é um aspecto do Nacionalismo Negro, que tem sua origem a partir das obras, palavras e ações da Unia(Universal Negro Improvement Association) fundada por Marcus Garvey em 1914. O foco fundamental do de Garveyismo é a promoção da união,integração da diáspora africana espalhada por todo mundo o Garveyismo se notabiliza por ser uma doutrinha também de cunho Pan-africanista portanto defende a unificação política, social, cultural do continente Africano. O pensamento de Marcus Garvey teve uma grande importância para formação de um movimento negro organizado pois estabeleceu conceitos da necessidade de auto-afirmação da população negra Garvey tinha como metas a serem alcançadas:

1° A promoção da consciência e unidade na raça negra, da dignidade e do amor


2° O desenvolvimento da África, livrando-a do domínio colonial e transformando-a numa potência.


3° Protestar contra o preconceito e a perda aos valores africanos.


4° Estabelecer insituições de ensino para negros, onde se ensinasse a cultura aficana.


O nome de Marcus Garvey deve ser lembrado e reconheçido por todos os militantes negros pois os esforços que este imenso líder realizou para a libertação do povo negro nunca poderam sera apagado da história moderna.

Amílcar Cabral um dos maiores líderes políticos Africanos


“A etapa fundamental da libertação dos povos não é um problema de luta armada ou luta desarmada; porque para nós é sempre luta armada. Existem dois tipos de luta armada: a luta armada na qual os povos combatem de mãos vazias, enquanto que os imperialistas ou colonialistas, esses sim armados, matam e assassinam; e a luta armada daqueles que como nós, reconhecendo que não somos seus escravos, empunham armas para responder aos imperialistas”.



(Amílcar Cabral )

SHAKA ZULU Um Líder Guerreiro








SHAKA ZULU – O GENERAL AFRICANO
A história Shaka Zulu, líder africano que expandiu a nação zulu, num feito comparável a Alexandre o Grande.




O potentado Zulu tem início com o reinado de Shaka, filho do chefe Senzanga Khoma, de um dos clãs mais fortes dos Zulus, que engravidara Nandi, uma mulher Lengani, que se tornou por isso sua terceira esposa. Mas ela era desagradável e pouco dócil, acabou sendo rejeitada junto com o filho, e voltou para os Lenganis, onde Shaka cresceu acalentando o sonho de se tornar Rei dos Zulus, e expandir o império.











A INFÂNCIA





O menino cresceu arrogante e antipático, e foi por isso marginalizado pelos outros meninos Lenganis, mas se tornou forte e um grande guerreiro. Shaka era o nome que os Zulus davam a um parasita intestinal; quando Nandi engravidou, de desagradável que era na tribo diziam que ela não estava grávida, apenas tinha um shaka na barriga. Vindo ao mundo, o parasita shaka, continuou sendo Shaka.O ano de 1802 foi um ano de seca e fome. O Rio Umfolozi, secou e a fartura que trazia ao vale que o abrigava e às margens, desapareceu. Com a escassez de alimentos o chefe Longani decidiu expulsar do Kraal todas as pessoas indesejáveis, entre as quais se encontravam Nandi e o filho Shaka.








NOVO EXÍLIO



Exilados partiram para as terras do sul, aonde chegaram ao reino de Dingiswayo, o mais importante dos chefes do sul que, ao ver Shaka e N'Xumalo, um exilado voluntário do clã Sixolobo, que se tornou seu único companheiro entre os Lenganis. O chefe adivinhou neles grandes guerreiros; eram fortes e mostravam destreza no uso das Azagaias, considerou-os bem vindos ao seu regimento. Nos anos seguintes, Shaka e N'Xumalo ganharam grande experiência em guerras e campanhas que ampliaram o território de Dingiswayo.






O GUERREIRO








Shaka começou a desenvolver técnicas pessoais de Guerra e Teoria de Combate!Discordava dos grandes agregados mulheres e crianças que acompanhavam o destacamento, denunciando à distância a aproximação, e dando a conhecer aos inimigos a disposição das tropas a todos os momentos, aguardando apenas o momento mais propício para o confronto. Não apreciava os rituais que antecediam as batalhas e dos lugares escolhidos -- com encostas suaves, para melhor apreciação dos espectadores.Ele não concordava com os arremessos das azagaias à distância, que permitiam a esquiva dos adversários. Discordava dos embates pouco contundentes, quando os dois exércitos estavam já desarmados, e da benevolência do vencedor, capturando apenas algum gado e umas quantas mulheres. Reprovava o uso de sandálias de couro de vaca pelos guerreiros, artefato que, no seu entender só tolhia a mobilidade em combate. Achava inclusive as azagaias impróprias para a luta. Preferia o uso de adagas para o corpo a corpo.Em segredo Shaka treinou com N'Xumalo ataque e defesa, força, destreza e luta corpo a corpo. Quebrou uma lança e encomendou ao forjador da tribo uma arma com o tamanho da metade da lança e o dobro do tamanho de parte cortante: uma Adaga!








A PRIMEIRA BATALHA






Em 1815, num confronto banal com os Butelezis, Shaka demonstrou o que e como queria que fosse uma guerra. No ritual inicial em que um ou dois guerreiros se adiantam para trocar insultos, ele inesperadamente levantou-se e correu descalço para o adversário. Com o seu escudo, Shaka enganchado no do adversário, expôs-lhe o peito e mergulhou nele a adaga curta. Arremeteu depois para as fileiras de vanguarda dos Butelezis, e junto com ele, todo o regimento Izicwe. Foi um massacre. Dezenas de inimigos mortos e de mulheres capturadas, centenas de cabeças de gado apreendidas.











MORTE DO PAI



Em 1816 o pai de Shaka, chefe dos Zulus morreu. Shaka removeu o filho destinado à sucessão e assumiu o comando do clã que tinha cerca de 1.300 pessoas e 300 guerreiros. Era um clã inexpressivo, menor que a maioria dos outros clãs, como os Sixolobos e os Lenganis, e que não expandira o seu território nos últimos cem anos.Tão logo ele assumiu o comando, uma das suas primeiras providências foi mandar os guerreiros jogar fora as azagaias tradicionais substituindo-as por adagas, proibiu o uso de sandálias e treinou as tropas no endurecimento das solas dos pés, fazendo-os dançar sobre espinhos e pedras batendo os pés com força no chão, até que as solas dos pés estivessem mais duras do que couro. Os guerreiros que não agüentavam e fraquejavam neste treinamento, eram mortos.Aumentou o tamanho dos escudos quase à altura de um homem, e treinou com os guerreiros: defesa e ataque corpo a corpo, com as técnicas que aperfeiçoara com N'Xumalo.











ESTRATÉGIA CORPO-BRAÇO-CABEÇA



Shaka Instituiu a técnica de combate “corpo-braços-cabeça”, em que o corpo era a grande concentração de tropas central, e a única que os inimigos podiam ver, os braços eram dois grupos de envolvimento rápido que atacavam pelos flancos, e a cabeça, um regimento que, nos dois primeiros estágios de qualquer batalha -- início com o embate frontal do corpo e o segundo - era o ataque dos braços pelos flancos - - ficava escondido por uma colina e de costas para a luta, ver a batalha. No momento adequado recebiam a ordem de ataque, que cumpriam sem pensar e sem tentar adequar-se à situação. Velocidade, rapidez na comunicação e astúcia eram os outros trunfos da estratégia.Shaka e N'Xumalo formavam uma dupla fantástica; onde ele era um planejador criativo e o amigo era um executor implacável.Uma manhã de 1816, Shaka reuniu os seus quatro esquadrões numa formação de quadrado oco. Inflamou os ânimos dos guerreiros com palavras de incentivo, enquanto estes batiam os pés no chão com violência -- à dança que caracterizaria para sempre os Zulu. Cada esquadrão era distinguido por diferentes cores dos panos de cabeça e pelos couros de gado dos escudos.








AS BATALHAS





Na batalha contra os Lenganis, Shaka ordenou uma marcha silenciosa. Na manhã seguinte o clã adversário acordou cercado por guerreiros Zulus. Foi à vingança contra o clã que expulsara a mãe e ele há anos atrás. Todos os desafetos pessoais foram empalados por estacas de bambu, e depois de horas de sofrimento, queimados ainda vivos. Os chefes apenas tinham o pescoço quebrado, numa morte rápida e sem sofrimento, e no final, absorveu os regimentos Langani no seu exército.Quando chefe Dingiswayo morreu, numa batalha contra uma tribo do norte, todo o contingente Izicwe se uniu aos Zulus. Shaka se movimentava com uma velocidade devastadora, dominando os pequenos clãs, cujos chefes eliminavam e cujas forças militares agregavam às suas.A batalha contra os N'Gwane, os apagou do cenário africano como clã. À vista do Corpo de Ataque Zulu, se posicionaram em tosca formação de combate, acreditando tratar-se apenas de mais uma investida por gado e mulheres, em que apenas alguns homens sairiam machucados. De repente descobriram com espanto que as alas Zulus estavam abertas, como os chifres de um touro. Os guerreiros Zulus caíram sobre os atordoados inimigos matando, e quando as forças N'Gwane tentaram se reagrupar para resistir, do nada apareceu à cabeça do exército de Shaka, as adagas totalmente sem clemência.Os guerreiros e os velhos foram mortos -- os Zulus nada viam de errado em ajudar a morrer os que eram idosos ou doentes -- as mulheres distribuídas entre os Kraal Zulu, e os meninos recrutados para o exército.








O REINADO DE SHAKA ZULU





Durante o reinado de Shaka, os homens combatiam dos 14 aos 60 anos, e nenhum guerreiro podia casar ou procriar antes de lavar a adaga no sangue de inimigos, e somente com seu consentimento, o que acontecia por volta dos 30 anos. Ele formou um batalhão só de mulheres, que devia seguir na retaguarda para cuidar da comida, reparar as armas danificadas e cuidar dos feridos. A regra básica para estes era: “se um Zulu está ferido, fale com ele. Se ele conseguir compreender o que você disse, cure-o, se não o mate”. Formou também um outro batalhão de idosos e deviam trabalhar constantemente.Em 1832 Shaka já consolidara a maior parte da sua nação, impondo uma ordem e uma disciplina cuidadosamente definidas; através de punições brutais, transformara um amontoado de clãs num reino unificado. Ele praticava um governo tirânico, mas não insano, assegurando ao seu povo suprimentos de água permanentes e fontes estáveis de alimentos.Os resultados benéficos do governo de Shaka eram evidentes. Uma área maior que muitos países europeus e que estivera desorganizada até então, tornara-se coesa e próspera. As centenas de tribos e clãs que viveram até ali na base de cada um por si, se proclamavam agora orgulhosamente de Zulu; era nesta altura uma temida nação de meio milhão de pessoas. A cidadania dentro da nação atingia a todos por igual, antigos ou novos integrantes.





A DECADÊNCIA DE SHAKA








Shaka não tinha descendente que pudessem suceder-lhe, assim ficou obcecado com a idéia de envelhecer e morrer. Feiticeiros se aproveitaram desse início de loucura para explorá-lo com promessas de óleos milagrosos que proporcionavam a imortalidade.O aparecimento dos primeiros cabelos brancos detonou um processo de loucura irreversível; a morte da mãe desencadeou uma onda de crueldade e perseguições terríveis, que abalaram toda a estrutura ZULU.Começou por ordenar a morte de todas as mulheres a serviço de Nandi, a “mulher elefante”, que com ela compartilharam a tumba, e que, quase todas, eram mulheres de alguns dos seus melhores e mais confiáveis generais.A mortalidade gratuita espalhou-se pelo reino; qualquer pessoa, por rir, espirrar, tossir, se coçar, sentar, dormir, amamentar ou mesmo comer e beber, podia ser decapitado, acusado de não demonstrar pesar pela morte da mãe de Shaka.Turbas frenéticas e assassinas corriam por todo o reino, para ver se alguém deixava de honrar Nandi. Os últimos meses de 1827 ficaram conhecidos entre os Zulus, como o tempo das trevas de Shaka.








A MORTE








Com o caos instituído no reino, M'Kabay, irmã do pai de Shaka e dois meio irmãos dele, Dingane e M'Halangana, junto com alguns comandantes militares, conspiraram e planejaram o assassinato do grande chefe Zulu.No dia 22 de Setembro de 1828, vários conspiradores se reuniram, foram ao Kraal de Shaka, e sem que este pudesse esboçar um gesto de defesa, lhe espetaram fundo e por diversas vezes as mortais azagaias.Terminava assim o homem que criou a Nação Zulu.
Dedico esse texto a todos aqueles que estão na luta para inclusão da Historia da África nas salas de aula, explicando que o continente e seus reis em nada ficam devendo em inteligência aos da Europa.

Clóvis Moura um intelectual revolucionário


Dois livros publicados em 1959 tornaram-se clássicos na literatura histórica brasileira - Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado, e Rebeliões da Senzala, de Clóvis Moura, modelos de duas formas radicalmente opostas de se considerar aqueles que sofreram a escravidão em nosso país. Celso Furtado, tributário de idéias tradicionais - e mesmo do limitado marxismo brasileiro de então - comparava os escravos dos engenhos de açúcar "às instalações de uma fábrica", pois eram comprados como elas e sua manutenção representava os custos fixos.

Rebeliões da Senzala contrapunha-se pioneiramente a essa visão do escravo como vítima passiva de seu destino. As visões dominantes da história de nosso passado escravista descreviam uma sociedade idílica, sem luta de classes e onde os conflitos entre senhores e escravos eram vistos como choques entre a cultura superior dos europeus, os senhores, e a barbárie dos africanos, os escravos, uma contradição que só seria resolvida quando os últimos fossem aculturados e, abandonando suas raízes originárias, adotassem a cultura dos dominadores. A principal fonte dessa visão rósea foi a obra de Gilberto Freyre, mas os ecos da visão senhorial podiam encontrados em quase todos os autores importantes de então, inclusive em marxistas como Caio Prado Jr. Foi preciso o esforço pioneiro de gente como Edison Carneiro, Clóvis Moura - com a sistematização definitiva feita em Rebeliões da Senzala - e da geração de estudiosos liderada por Florestan Fernandes, Octávio Ianni, Emilia Viotti da Costa, Fernando Henrique Cardoso, e tantos outros, para que essa visão idílica pudesse ser colocada em seu justo lugar de apologia da ordem dominante, nostálgica do império e do escravismo.

Rebeliões da Senzala é obra de um autor marxista, no sentido ortodoxo da palavra. Seu objetivo é investigar o passado histórico para compreender melhor as lutas do presente, e forjar os instrumentos conceituais que permitam, aos oprimidos de todos os matizes de nosso tempo, lutar pela igualdade entre os homens e por uma forma superior de organização da sociedade. Nesse sentido, Clóvis Moura partiu, contra aquelas visões tradicionais, de uma premissa teórica marxista fundamental: como em todas as demais sociedades divididas em classes, na sociedade escravista também existiu luta de classes.

Seu livro, Rebeliões da Senzala, é assim um marco, o primeiro painel das lutas escravas no Brasil, que assinala o declínio das velhas concepções sobre a passividade e a docilidade do escravo. Livro que abriu uma vertente que levaria, nos anos seguintes, a um reconhecimento aprofundado da luta escrava e sua importância para a dinâmica da sociedade brasileira. O número de estudos que surgiram, então, muitos inspirados diretamente pela sua leitura, levaram ao reconhecimento de que a história do negro no Brasil se confunde com a história do povo brasileiro.

As lições de Rebeliões decorrem disso. Ele nos ajuda a compreender como, a partir daquelas contradições de nosso passado histórico, o Brasil tornou-se o que é hoje. Em primeiro lugar, o caráter e a persistência de algumas características que, enraizados no passado colonial e escravista, perambulam ainda como autênticos mortos-vivos pelo presente de nosso país, na sobrevivência fantasmagórica do poder das oligarquias tradicionais, na pessoa de políticos como Antonio Carlos Magalhães e assemelhados, estes sim os verdadeiros dinossauros de nossa vida política e social. Foi a relevância numérica da escravidão, seu tempo de duração e a forma como foi abolida no Brasil que "determinaram a emergência do modelo do capitalismo dependente em que vivemos até hoje", ensina Clóvis Moura. Aquelas elites, que dominaram durante todo o período escravista, na Colônia e no Império, conduziram e determinaram a forma como se deu a abolição em nosso país, e continuaram à frente do Estado e do governo sob a República. Contra essas elites, Rebeliões da Senzala é talvez o primeiro estudo onde a história do escravo (e do negro) brasileiro é colocada no seu justo lugar de história do povo brasileiro, e não de um segmento populacional à parte, específico e segmentado. Rebeliões reata, assim, a história do povo brasileiro de nossos dias com a história daqueles que, antes de 1888, mourejavam sob o instituto infame e desumano que foi a escravidão.

Ao aprofundar o conhecimento de nosso passado, e demonstrar que a história da história da escravidão faz parte do fio contínuo da história de nosso povo, Clóvis Moura aprofundou também, e inovou, o pensamento marxista e contribuiu para que aprofundar a consciência socialista e anti-racista das gerações seguintes de historiadores e militantes do movimento revolucionário e anti-racista brasileiro.

Uma dessas inovações é a lição fundamental, aprofundada nas obras que vieram depois de Rebeliões da Senzala, de que, em sociedades como as nossas, os conceitos de classe e raça são inseparáveis para a compreensão da situação das classes dominadas. Não se compreende a situação das classes dominadas no Brasil, hoje como no passado, sem que se leve em conta as duas dimensões essenciais da dominação, a classista e a racial. Elas imbricam-se, e conferem características próprias às relações de dominação em nossas sociedades.

Rebeliões da Senzala preparou também o rompimento com os esquemas fossilizados do oficialismo marxista de então, que impunham uma evolução das sociedades obrigatoriamente em cinco estágios sucessivos - comunidade primitiva, escravismo, feudalismo, capitalismo e socialismo. Ao ajudar a resolver o problema que durante décadas atormentou os estudiosos do passado brasileiro - qual a natureza do modo de produção que aqui existia, capitalista ou feudal - Clóvis Moura deu importante passo para a compreensão de elas estavam ligadas a uma visão eurocêntrica da evolução das sociedades, que não se aplica ao Brasil, onde o passado foi escravista colonial e o modo de produção capitalista emergiu, depois de uma lenta transição, da desagregação do escravismo - e não do feudalismo, como na versão clássica européia.

Finalmente, um último aspecto que deve ser ressaltado: contra as análises tradicionais, que enfatizavam o caráter reflexo de nossa história, Rebeliões da Senzala mostrou que a formação social brasileira era um pouco mais complexa. Aqui, influência externa interage com a dinâmica interna da sociedade brasileira, e nossa história resulta da combinação destes dois elementos, a influência externa, colonial e neocolonial (e imperialista, hoje), com os interesses que dominam nossa sociedade.

Historiador marxista e veterano militante comunista, o objetivo da atividade intelectual e científica de Clóvis Moura é compreender o passado para fundamentar a ação transformadora no presente. Neste ponto, um elemento se destaca: o que é o conhecimento histórico, como se dá a intervenção consciente do homem na história, e qual é a natureza da consciência de classe. São temas marxistas fundamentais, não por um capricho teórico, mas por uma necessidade prática. A luta política orientada pelo marxismo não se fundamenta nos desejos arbitrários dos militantes, sendo orientada por teses que surgem da análise cuidadosa da origem da situação atual, análise em que os aspectos históricos combinam-se com os conjunturais, compreendidos como desdobramento de um processo histórico mais longo e que, portanto, só podem ser entendidos em sua inteireza a partir de sua gênese.
A história é, para os marxistas, a ciência no sentido mais profundo. A objetividade do processo histórico deve ser procurada na análise cuidadosa do desdobramento da aventura humana através do tempo. A lógica deste processo, que é a lógica da história, está inscrita na ação dos atores da história. Nesse sentido, a história não é linear ou previsível como, por exemplo, a trajetória dos astros no firmamento, e toda compreensão teleológica da história de uma história que seja autora de seu próprio destino mais próxima do providencialismo religioso com seu passado já pré-definido na mente eterna de um criador, do que propriamente do marxismo, que compreende a história como resultado da ação humana, que encara o processo histórico como conseqüência do entrechoque de vontades, interesses, culturas, preconceitos, nível de conhecimento, dos homens que são personagens desse processo.

Assim, o processo histórico não é externo à ação dos agentes sociais e às suas lutas, mas intrínseco a eles, determinado por eles e pela consciência histórica e social daqueles atores sociais. Isto introduz outro elemento fundamental na visão marxista da história, cuja compreensão em nosso país foi iluminada pelas conquistas registradas em Rebeliões da Senzala: trata-se da complexa questão da consciência de classe.
Clóvis Moura aborda esta questão de forma explícita nas conclusões de seu livro, onde diferencia os escravos que, ao rebelar-se, iniciavam o processo de formação de uma "classe para si", daqueles que, conformados com seu destino e prostrados sob o escravismo, sem compreender sequer sua situação imediata, eram ainda componentes "de uma classe em si, simples objeto do fato histórico".

Isto é o que diferencia o conteúdo da consciência dos atores sociais e imprime sua marca ao processo histórico. Clóvis Moura filia-se à longa tradição marxista, iniciada em 1847 com a publicação de Miséria da filosofia, onde Karl Marx, sob nítida influência hegeliana, diz que massa de trabalhadores de um país, que é uma classe em si, só na luta contra o capital "constitui-se em classe para si mesma". Os interesses que ela defende tornam-se interesses de classe", e a luta de classe "é uma luta política". Mais tarde, em Dezoito Brumário de Luís Bonaparte, Marx reafirma esta tese: os camponeses se distinguem dos demais franceses, diz, por suas condições econômicas de existência, seu modo de viver, seus interesses e cultura, e por se opor às outras classes de forma hostil. Por isso, eles "formam uma classe"; entretanto, sem nenhuma união nacional ou organização política, diz Marx, eles "não formam uma classe".

A "consciência histórica", a consciência social, de classe, não se reduz à percepção imediata, pelo oprimido, de sua situação, mas envolve uma reflexão aprofundada sobre as relações sociais, que tem caráter científico e elabora uma compreensão mais avançada e mais complexa do que mera sensação imediata. Marx já havia notado, em O Capital, que a ciência seria desnecessária se houvesse coincidência entre essência e aparência.
Em conseqüência, uma compreensão do processo histórico com as ambições que a análise marxista se impõe não pode resumir-se à apreensão dos significados com que a ação social, em seu sentido mais amplo, aparece para a consciência dos próprios agentes históricos. É preciso ir além disso; compreender o grau de consciência que a própria ação indicava - e, daí, a distinção entre as formas ativas e passivas de resistência do escravo, aquelas denunciadoras de elementos iniciais de uma compreensão que poderia englobar as múltiplas e complexas relações em que o escravo estava inserido; estas, indicadoras de uma compreensão ainda limitada e incipiente, presa às vicissitudes do dia a dia e das imposições da sobrevivência e da acomodação. É preciso distinguir também, aqui, o sentido político que a ação escrava tinha, não - de novo - na forma como ele aparecia imediatamente ao escravo, mas na sua capacidade de formular um projeto mais global de reordenação social, capaz ou não de transcender os limites do escravismo. O sentido político não se define apenas subjetivamente, mas depende também das condições objetivas da ação e da compreensão da relação entre estes dois aspectos, subjetivo e objetivo. Sem esta distinção, a expressão sentido político da ação indica mais propriamente a boa intenção do analista de respeitar a individualidade do personagem da história do que o caráter de sua ação que, assim indefinida, pode oscilar da malandragem adaptativa, macunaímica, à vontade revolucionária manifestada pelos malês em Salvador, em 1835 - um leque amplo o suficiente para diluir a correta compreensão nas miríades de forma que o sentido político da ação pode assumir.

Finalmente, é aqui que está ancorada a ênfase, no conjunto da obra de Clóvis Moura, na rebeldia escrava, na consideração da ação dirigida contra a manutenção do escravismo como principal elemento para a compreensão das contradições fundamentais não só daquele modo de produção, como do capitalismo que o sucedeu, e das formas políticas que, sobreviventes do passado, estão ainda baseadas num autoritarismo gerado e nutrido no domínio da senzala pela casa-grande.

Entre Zumbi e Pai João, para usar a metáfora que ficou famosa, a ênfase recai sobre o herói palmarino. Não por um gosto arbitrário do heróico, nem pelo desconhecimento das complexas formas que as relações entre senhores e escravos assumiram. A própria continuidade da exploração escravista e colonial impunha uma combinação complexa entre coerção e convencimento, onde o chicote e os castigos físicos combinavam-se em doses variadas com pequenas concessões cotidianas, num jogo de pressões e contrapressões que a historiografia de nossos dias descreve com muita precisão.

Entretanto, trata-se aqui de captar, primeiro, aquela dimensão onde o caráter e as contradições do escravismo possam emergir com nitidez. A negociação possível naquele regime desumano podia disfarçar as agruras da opressão e permitir ao escravo estratégias de sobrevivência que minoravam sua sorte, e a ênfase neste aspecto parece baseada num contratualismo impróprio e fora de época, envolvendo partes absolutamente desiguais, o dono do escravo e o escravo por ele possuído, uma assimetria social e política indisfarçável. O conflito, ao contrário, parte cotidiana da vida do escravo, podia variar de grau e intensidade, de pequenas resistências diárias no trabalho, à morte de feitores e senhores ou à rebelião aberta, e sua eclosão quebrava todos os véus, dilacerava os disfarces que a negociação construía, opondo as duas facetas contraditórias e inconciliáveis daquela relação, o senhor e o escravo.

Steve Biko e a concepção da consciência negra


"A Consciência Negra é, em essência, a percepção pelo homem negro da necessidade de juntar forças com seus irmãos em torno da causa de sua atuação – a negritude de sua pele – e de agir como um grupo, a fim de se libertarem das correntes que os prendem em uma servidão perpétua. Procura provar que é mentira considerar o negro uma aberração do “normal”, que é ser branco. É a manifestação de uma nova percepção de que, ao procurar fugir de si mesmos e imitar o branco, os negros estão insultando a inteligência de quem os criou negros. Portanto, a Consciência Negra toma conhecimento de que o plano de Deus deliberadamente criou o negro, negro. Procura infundir na comunidade negra um novo orgulho de si mesma, de seus esforços, seus sistemas de valores, sua cultura, religião e maneira de ver a vida.''


A inter-relação entre a consciência do ser e o programa de emancipação é de importância primordial. Os negros não mais procuram reformar o sistema, porque isso implica aceitar os pontos principais sobre os quais o sistema foi construído. Os negros se acham mobilizados para transformar o sistema inteiro e fazer dele o que quiserem. Um empreendimento dessa importância só pode ser realizado numa atmosfera em que as pessoas estejam convencidas da verdade inerente à sua condição. Portanto, a libertação tem importância básica no conceito de Consciência Negra, pois não podemos ter consciência do que somos e ao mesmo tempo permanecermos em cativeiro.


Queremos atingir o ser almejado, um ser livre.O movimento em direção à Consciência Negra é um fenômeno que vem se manifestando em todo o chamado Terceiro Mundo. Não há dúvidas de que a discriminação contra o negro em todo o planeta tem origem na atitude de exploração, por parte do homem branco. Através da História, a colonização de países brancos pelos brancos resultou, na pior das hipóteses, numa simples fusão cultural ou geográfica, ou, na melhor, no abastardamento da linguagem. É verdade que a história das nações mais fracas é moldada pelas nações maiores, mas em nenhum lugar do mundo atual vemos brancos explorando brancos numa escala ainda que remotamente semelhante ao que ocorre na África do Sul. Por isso somos forçados a concluir que a exploração dos negros não é uma coincidência. Foi um plano deliberado que culminou no fato de até mesmo os chamados países independentes negros não terem atingido uma independência real.Para a abordagem da Consciência Negra, reconhecemos a existência de uma força principal na África do Sul. Trata-se do racismo branco. Essa é a única força contra a qual todos nós temos de lutar. Ela opera com uma abrangência enervante, manifestando-se tanto na ofensiva quanto em nossa defesa. Até hoje seu maior aliado vem sendo nossa recusa em nos reunirmos em grupo, como negros, pois nos disseram que essa atitude é racista. Desse modo, enquanto nos perdemos cada vez mais num mundo incolor, com uma amorfa humanidade comum, os brancos encontram prazer e segurança em fortalecer o racismo branco e explorar ainda mais a mente e o corpo da massa de negros que não suspeitam de nada. Os seus agentes se encontram sempre entre nós, dizendo que é imoral nos fecharmos num casulo, que a resposta para nosso problema é o diálogo e que a existência do racismo branco em alguns setores é uma infelicidade, mas precisamos compreender que as coisas estão mudando. Na realidade esses são os piores racistas, porque se recusam a admitir nossa capacidade de saber o que queremos. Suas intenções são óbvias: desejam fazer o papel do barômetro pelo qual o resto da sociedade branca pode medir os sentimentos do mundo negro. Esse é o aspecto que nos faz acreditar na abrangência do poder branco, porque ele não só nos provoca, como também controla nossa resposta a essa provocação. Devemos prestar muita atenção neste ponto, pois muitas vezes passa despercebido para os que acreditam na existência de uns poucos brancos bons. Certamente há uns poucos brancos bons, do mesmo modo que há uns poucos negros maus. Mas o que nos interessa no momento são atitudes.Precisamos eliminar de imediato a idéia de que a Consciência Negra é apenas uma metodologia ou um meio para se conseguir um fim. O que a consciência Negra procura fazer é produzir, como resultado final do processo, pessoas negras de verdade que não se considerem meros apêndices da sociedade branca. Essa verdade não pode ser revogada. Não precisamos pedir desculpas por isso, porque é verdade que os sistemas brancos vêm produzindo em todo mundo grande número de indivíduos sem consciência de que também são gente. Nossa fidelidade aos valores que estabelecemos para nós mesmo também não pode ser revogada, pois sempre será mentira aceitar que os valores brancos são necessariamente os melhores. Chegar a uma síntese só é possível com a participação na política de poder. Num dado momento, alguém terá que aceitar a verdade, e aqui acreditamos que nós é que temos a verdade.