O
sonho destruído de Malcolm X
Por toda vida, Malcolm X sempre foi forçadamente obrigado
a conviver com a violência provocada pelo racismo. Não apenas a violência
física, manifestada através de ataques diretos, ou ameaças, mas também um tipo
de violência bem característica produzida pelo racismo, à violência
psicológica, aquela que ataca diretamente na autoestima, no orgulho. Violência
psicológica causa feridas muito profundas, chagas mentais que não bem tratadas
podem se tornar irreparáveis. As crianças são os alvos mais frágeis para serem pegas
pela violência psicológica racial, meninos e meninas quando não amparados com
carinho e proteção por adultos conscientes, crescem e se tornam adultos
traumatizados. Malcolm não foi exceção, sua infância teve um acontecimento que
pode ser caracterizado como uma violência psicológica.
Malcolm depois de ter sido separado de sua mãe, foi
adotado por um casal de brancos que o colocaram em uma escola igualmente
frequentada por brancos. Malcolm não se abateu em ser o único preto em sua
turma, ele conseguiu ser um aluno exemplar, obtinha boas notas, seu desempenho era
melhor do que de muitos estudantes brancos de sua sala, isso em tese o
credenciava em conseguir escolher qualquer profissão que desejasse quando se
tornar-se adulto. Mas Malcolm ainda criança sentiu o sabor amargo de viver em
uma sociedade racista — não importa o quão bom seja o negro, ele sempre estará
na dianteira do branco, essa afirmação faz sentido, é veio justamente de seu
professor a confirmação, o sonho de criança de Malcolm em ser advogado quando
adulto foi esfacelado. Leiam o trecho de sua Autobiografia:
Por
algum motivo, não me lembro qual, fiquei sozinho na sala com o Sr. Ostrowski, o
professor de inglês. Era um homem branco alto, um tanto avermelhado, com bigode
imenso. Fora ele quem me dera algumas das minhas melhores notas e sempre dera
entender que gostava de mim. Era uma espécie de ''conselheiro'' nato sobre o
que um aluno devia ler, fazer ou pensar, a respeito de qualquer coisa.
Costumávamos fazer gracejos cruéis a seu respeito: por que estava ensinando em
Mason, em vez de estar trabalhando em algum outro lugar, onde pudesse obter
para si próprio um pouco mais de ''sucesso na vida'' que vivia dizendo que
devíamos procurar?
Tenho
certeza que as intenções dele eram provavelmente as melhores possíveis nos
conselhos que me deu naquele dia. Duvido muito que tencionasse me causar algum
mal. Era simplesmente algo que lhe era inerente, como um homem branco
americano. Eu era um dos melhores alunos da turma, um dos melhores alunos da
escola. Mas tudo que ele podia imaginar para mim era um futuro ''em seu
lugar'', como quase todos os brancos imaginam para os pretos.
—
Malcolm — disse-me ele —, deve estar pensando na carreira que pretender seguir.
Tem alguma idéia a respeito?
A
verdade é que eu nunca havia pensado no problema. Jamais pude compreender,
assim, por que lhe disse:
—
Já, sim, senhor. Estive pensando que gostaria de ser advogado. Naquele tempo,
Lansing não tinha advogados negros, nem médicos, que pudessem me inspirar tal
aspiração. Tudo o que eu realmente sabia era que um advogado não lavava pratos,
a minha atividade no momento.
O
Sr. Ostrowski ficou surpreso. Recostou-se na cadeira e cruzou as mãos atrás da
cabeça. Exibiu um sorriso incipiente e disse:
—
Malcolm, uma das primeiras necessidades da vida para cada um é ser realista.
Por isso, peço que não me leve a mal. Sabe perfeitamente que todos aqui
gostamos de você. Mas tem que ser realista e encarar de frente os problemas de
ser um nigger. Ser advogado... Isso não é um objetivo realista para um negro.
Devo pensar em algo que possa realmente ser. É muito hábil com as mãos, sabe
fazer coisas. Todo mundo admira os seus trabalhos de carpintaria. Por que não
planeja tornar-se carpinteiro? Todo mundo gosta de você e tenho certeza que
teria sempre muitas encomendas.
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